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sexta-feira, dezembro 24, 2004




Árvore de Palavras Desconexas



Eu não sei escrever textos de Natal. Nem com inspiração comercial, nem com loas de amizade, nem com cunho social. Escrevo sobre esses assuntos todos os dias, penso neles, mas natalinamente falando não dá. Além disso, gastar palavras com algo não original não é comigo... quer dizer, até é, mas não admito.

Pois ao invés de falar de luzinhas natalinas e coisas afins, eu deixo um abraço a você leitor, que me atura durante sua leitura, tentando compreender meus devaneios e incursões literárias, com paciência e - espero - boa vontade.

Deixo um grande beijo a minha mulher - inspiração-mor de tudo - e minha enteada, um arco multicolorido que deu nova vida a minha não tão velha vida. A meus sogros e minha família, que também merecem todos os votos e carinhos.

Este texto está uma porcaria, eu sei. Talvez piegas. Compartilho da opinião de Zuenir Ventura, que pediria a Papai Noel para nunca escrever textos natalinos. Mas este ainda não acabou, espere mais um pouco.

Aos meus amigos, que sempre dão força a este combalido, lutador e pretenso escritor e malabarista da vida, um grande abraço e - mais - votos de felicidade. A todos vocês, um grande Natal e um bom ano que se aproxima. E não vou escrever mais sobre Natal. Percebi depois disso tudo que não é meu forte. O máximo que consigo redigir é uma árvore de palavras desconexas.


________

Feliz Natal, Próspero Ano Novo! Este recanto entra em recesso e volta na primeira segunda-feira do novo ano. Aproveitem o fim de ano, e perdoem minha falta de jeito com textos comemorativos.



Conto depositado por Art at 1:13 AM






quarta-feira, dezembro 22, 2004




Viagens - A Jaca



Certa vez, escrevi sobre uma engraçada - para quem lê - viagem de avião para o Recife. Antes desta, eu já havia percorrido o mesmo destino de ônibus. Uma viagem mais tranquila, você pensa. Nem tanto, digo eu.

Viajar de ônibus durante 44 horas nunca é tranquilo. Ainda mais saindo do Rio de Janeiro em um domingo de semifinal Flamengo x Vasco pelo campeonato carioca, e mais ainda quando se sabe que o ônibus vai partir no meio de um jogo onde o Flamengo está ganhando bem. Para um flamenguista é um suplício. Para mim, portanto, era um suplício.

Um grande amigo - grande amigo mesmo, porque é tão flamenguista quanto eu, e não estava vendo o jogo tanto como eu - me deixou na rodoviária. Eu consegui, após alguns minutos, encontrar o ônibus atrás das intermináveis caixas com vários presentes que as pessoas estavam levando para Pernambuco. Esta foi a primeira impressão da viagem: O nordestino é um povo extremamente solidário. Se fossem pessoas do Sul maravilha, levariam só uma lembrancinha e olhe lá.

Sair da rodoviária do Rio tem um início previsível: engarrafamento, calor - apesar do ar-condicionado do ônibus - e buzinas. Depois, Niterói, Macaé e Campos passaram pela janela de forma seguida. Primeira parada. Depois Espírito Santo. Vitória e São Mateus. Segunda e terceira paradas. A seguir, a interminável Bahia. Várias cidades, várias paradas. Ao chegarmos em Feira de Santana, já no fim da segunda noite de trajeto, quase madrugada, me surpreendo com a revelação do motorista: " - Daqui só saímos em comboio, porque dá muito assalto.". Gulp.

De Feira de Santana até o Recife seriam mais doze horas de viagem, aproximadamente. Aracaju, Maceió e - finalmente - Recife seriam as paradas. O que ninguém contava é que - além da insegurança reinante entre os passageiros por causa da declaração do motorista - um incauto abrisse uma jaca dentro de um ônibus com ar-condicionado. Você já sentiu o cheiro de jaca? É no mínimo forte. Imagine sentir o cheiro de jaca por doze horas. Vou reescrever isto. Imagine sentir o cheiro de jaca por DOZE horas? Agora consegui passar a carga dramática necessária.

Uma viagem desgastante e longa se torna insuportável com cheiro de jaca. Já não bastava o cheiro do banheiro do ônibus?! Qualquer viajante que se preze está preparado para aturar o cheiro do banheiro. Já o da jaca... Levantou-se a suspeita que o cheiro do banheiro foi amplificado pelos intestinos alimentados com a jaca. Depois de algum tempo, todos no veículo - inclusive o próprio "criminoso" - estavam enfastiados com o cheiro da dita cuja.

Passamos incólumes pelos assaltantes que agiam em Feira de Santana, mas ao sairmos do ônibus no Recife, ninguém mais estava aguentando sequer a palavra jaca, que dirá o cheiro. Sinceramente, entre o medo de avião e o cheiro da jaca, eu fico com o medo de avião.


______
Este texto está sendo publicado mais cedo, devido a problemas técnicos. Como os jornais de domingo saem aos sábados, creio que posso também me sentir no direito de antecipar colunas



Conto depositado por Art at 12:04 AM






segunda-feira, dezembro 20, 2004




Primeira Vez



Era uma noite linda, céu estrelado. Tudo era apenas brincadeira e foi crescendo¹. Passei por você e não lhe dei atenção. No bairro do Flamengo, aquela madrugada de um dia que se tornaria inesquecível. Mal imaginava que dali a pouco estaria contigo em meus braços.

Estava com uns amigos, que pararam o carro. Olhei você e seu corpo perfeito, cheio de curvas. Deitei com você na grama. Manuseei cada pedaço do seu ser. Observei cada jeito. Enfiei minha ferramenta. Primeiro de forma delicada, depois com violência.

Você estava inerte, mas parecia que gostava. Seu silêncio me torturava. Xingava você de todos os nomes, de todas as maneiras possíveis. Fiquei nervoso, era minha primeira vez. O sol já raiava, quando terminei o ato. Estava embebido no seu líquido, empapado de suor.

Pena que seu líquido era graxa, o seu corpo era borracha e minha ferramenta era um macaco. E esta foi a primeira vez que eu troquei um pneu.

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¹ - Trecho da música "Sonhos", de Peninha





Conto depositado por Art at 1:14 AM






sexta-feira, dezembro 17, 2004




Borboleta Amarela




Juliana é uma menina cheia de sonhos. Tem um namorado - que mora longe - e vive poupando seu dinheiro. Poupa seu dinheiro para vê-lo, para poder construir seu futuro e viver feliz ao lado de seu amor. Como foi dito na primeira linha, ela é cheia de sonhos. E um destes, em particular, a intriga demais.

Todas as noites, no entremeio de vários sonhos, Juliana sonha com uma borboleta amarela. "- O que significaria isso?", ela se pergunta sempre que acorda. Basta fechar os olhos e sonhar, que no intervalo entre Aruba e Fernando de Noronha aparece ela, a borboleta amarela.

No fim de mais um ano recheado de saudades, Juliana conversou com sua mãe sobre o fatídico inseto amarelo. A matriarca escutou atenciosa e silente toda a sua explicação. Juliana perguntou a sua progenitora o que deveria fazer, mas não ouviu resposta. Pensou consigo mesmo que fazia fé e compras no mercado de ilusões¹, por estar sempre com a cabeça nas nuvens. Nuvens que talvez escondessem o bichinho simpático que, ironicamente, perturbava suas noites.

No dia seguinte, recebeu duas passagens de avião de sua mãe, para que viajasse na direção de seu amor. Juliana estranhou, pois sabia que a maré não estava para peixe, e não estando para peixe, como as passagens haviam surgido?

Encontrou sua mãe, agradeceu e perguntou como havia se dado o milagre das passagens. A resposta foi surpreendente: " - Minha filha, ao ouvir você falar de seu sonho, me passaram algumas coisas pela cabeça: É final de ano e em todo reveillón se diz que amarelo é a cor do dinheiro. Borboleta tem no jogo do bicho. Logo, fui na banquinha, joguei na milhar e no grupo da borboleta. Não deu outra, acertei o primeiro prêmio! Na cabeça! Paguei minhas dívidas e ainda sobrou dinheiro para lhe dar um presente."

Com o sorriso no rosto, Juliana arrumou suas malas para rever seu amado. Borboleta é um bichinho simpático. " - E dá sorte!", concluiu, cada vez mais sorridente.

_______

texto em homenagem a uma amiga querida, Juliana, que vive uma história de amor muito parecida com a que vivo. Felicidades minha amiga.

¹ Trecho de "Coca-cola e Iguarias", música do cearense Valdo Aderaldo, gravada por Eliana Printes






Conto depositado por Art at 1:50 AM






quarta-feira, dezembro 15, 2004




Fila do Emprego



Jurandir acordou cedo para ir a Agência de Empregos. Para ver se tinha uma vaga de eletricista. Vida dura a de Jurandir. Chegou cedo, e sua senha foi a de número 455, o suficiente para sentar em uma daquelas cadeirinhas desconfortáveis, aproveitar o ar-condicionado e ver TV.

Havia ao menos 454 pessoas a sua frente, e com certeza outras tantas atrás. Jurandir - que cansou de ver a TV - passou a observar aquelas pessoas e pinçar fatos cotidianos relacionados a elas. E cá entre nós, fatos cotidianos são muito mais agradáveis que o programa da Xuxa.

Ao seu lado, um taxista, que chamou uma mulher para sentar ao lado dele. No intervalo da chuva de cantadas que distribuía contra a moçoila, ex-caixa de supermercado, bradava contra seu emprego anterior: " - Eu cansei de trabalhar pr´aquele babaca. Desde uns 178 anos atrás(sic), quando a Princesa assinou a Lei Laura(sic sic), não existem mais escravos. Por que eu trabalhava de escravo então? Por que?"

Jurandir riu - quase não conseguiu conter a gargalhada - mas se controlou. E ainda lembrava dos versos de Roberto Carlos, na música Lady Laura. Até porque, 178 anos por 178 anos, a Lady e a Lei têm quase a mesma idade. Sentado atrás de Jurandir, um caminhoneiro. Falando sobre viagens, mulheres, dinheiro. Parecido com uma personagem do desenho do Pica-Pau. Contando orgulhoso suas aventuras e desventuras, como a do dia que não pagou a última prestação do caminhão para fazer uma farra com uma mulher. E que não podia pedir dinheiro emprestado a sua esposa, porque isso se transformaria num divórcio. A solução foi recorrer a um agiota. Farra cara essa.

O tempo passava e pessoas entravam. O tempo passava e pessoas saíam. E Jurandir observava aquela gama heterogênea de pessoas a sua frente. " - Muita gente deve depender dessas pessoas", pensou. Pensou em sua família também. Mulher e filha, lindas. A filha acabou de perder o primeiro dentinho, vê só! O número de Jurandir foi chamado. E ele fez sua inscrição. Saiu cansado, pronto para almoçar em algum cantinho da cidade com um precinho camarada. Pronto para renovar suas forças e esperanças e torcer para o dia em que terá um emprego.




Conto depositado por Art at 12:00 PM






segunda-feira, dezembro 13, 2004




Viagens - O Medo de Avião



Viajar é sempre uma coisa ótima, certo? Depende, diria eu. Principalmente se o eu em questão for um eu suburbano que havia mais de dez anos não viajava de avião. Aquele pedaço gigante de ferro que voa é difícil de controlar, imagino eu. Embora seja o segundo meio de transporte mais seguro do mundo - o primeiro é o elevador, acredite - me assusta o fato de que se o avião der defeito, ou se o comandante conchilar no manche - sem segundas intenções, por favor - não há para onde correr.

Após esta longa - porém necessária - introdução, sinto-me à vontade para tornar público o dia em que todos os meus medos - quase - se tornaram realidade.

Indo do Rio de Janeiro para o Recife, tudo se pronunciava a favor de um calmo vôo. Céu Azul, minha mulher ao lado, a vista da Baía de Guanabara e do Cristo Redentor, uma pequena e teimosa lágrima que caía malandra no lado esquerdo da face e a sensação de tchau estampada nos meus sentimentos.

Após duas horas de viagem, um suco de frutas - " - Este suco é natural? Não, nesta companhia de aviação o suco é sobrenatural" - e algumas seis revistas lidas, notei que ao invés do céu azul, o pedacinho de lata estava envolto por várias nuvens, e a janelinha estava molhada. " - Ops, chuva", pensei eu. Pensei certo, em parte.

Não era uma chuva, e sim um dilúvio. Se meu desespero tivesse tomado conta, estaria contando que vi Noé e um casal de rinocerontes me dando tchau da arca, mas como meu estado se manteve com um mínimo de dignidade, esta visão se torna apenas uma suspeita. Adicione-se a isto o fato de todos os amigos que viajaram para o Recife terem me advertido sobre a turbulência que balança os aviões nos arredores da capital pernambucana.

A turbulência se manifestou brilhantemente. Fiquei verde. Não somente verde. Como diria o Rei Roberto Carlos, verde, amarelo, azul e branco também. O avião não conseguia pousar nos Guararapes¹, eu não conseguia me mexer na cadeira e minha mulher não conseguia me acalmar. Combinação perfeita para um drama. O avião teve de arremeter três vezes e fazer a volta por João Pessoa em todas elas.

Com minha ignorância, não sabia o exato significado de arremeter, mas lembrava que, na maioria dos últimos acidentes aéreos, foi em uma arremetida que o avião se chocou contra algo. Eu só pensava duas coisas: A primeira, que eu não deveriar entrar em pânico; a segunda, que eu já estava em pânico.

Depois de mais de uma hora, o avião finalmente conseguiu pousar e eu finalmente entendi porque o Papa beijava o chão de todo lugar onde o avião dele pousava. Ele deve ter medo de avião. E falando em medo de avião, ao entrar no táxi adivinha qual música tocava? "Foi por medo de aviãaaaaaao"²...

________

¹ - Aeroporto da cidade do Recife; ² - Música de Belchior



Conto depositado por Art at 1:21 AM






sexta-feira, dezembro 10, 2004




Desconhecidos versus Famosos



Três atos, três estórias e três níveis de fama.

Nivel 1 - Quase desconhecido

Rolava um futebol descontraído no subúrbio do Rio de Janeiro, em uma quarta-feira do ano de 1995. Futebol no subúrbio quarta-feira é uma instituição quase sagrada que tem horário certo de começo e término. As mulheres cariocas sabem que não precisam se preocupar na quarta, pois seus pares estarão em casa antes das 22 h, para ver a jornada futebolística da TV Globo.

Pois bem, em um destes embates pela bola, houve uma dividida ríspida, a qual se seguiu este diálogo:

" - Meu irmão, quer quebrar a minha perna?"

" - Deixa de ser maricas, futebol é pra homem!"

" - Meu irmão, sabe quem eu sou? Sou Fábio Noronha, goleiro do Flamengo!"

" - Prazer, eu sou Alessandre, mas todos me conhecem como Girino. Agora que nos apresentamos, larga de ser mariquinha e joga que nem homem!"

Segue o jogo...

* * *


Nível 2 - Famoso

André e dois amigos estavam no Baixo Gávea dia desses de pré-carnaval, após o desfile do Monobloco¹. Em estado de sobriedade duvidoso, buscaram a aprazível região para tomar mais algum (ns) gole(s) de cerveja.

Enquanto os três procuravam o bar mais vazio - e mais barato - do local, surge a figura de Tânia Alves. Bela e esguia para sua já não tão tenra idade, Tânia desperta em André o desejo de revelar algo que há muito guardava para si.

" - Tânia Alves!"

" - Oi!"

" - Sou seu fã!!"

" - Ah é? Você tem meus discos?"

" - Não, eu tenho sua Playboy!!!"

Enquanto Tânia Alves ficou visivelmente ruborizada, os amigos de André - inconformados - não o perdoaram por ter esquecido de perguntar o mais importante: Quando a filha de Tânia posaria nua? Tudo bem. Menos de um ano depois, a filha dela posou nua. Coleções completas e paz reestabelecida.

* * *


Nível 3 - Mito

Um menino passeava pelo calçadão da praia. Tinha seus 15 anos. Um menino suburbano, que - crescido no Rio de Janeiro - nunca se importou com a presença de atores. Se considerava um carioca, e sendo um carioca, partia da teoria que se um escafandrista sentasse em um bar, o carioca continuaria indiferente². Mas como toda regra tem sua exceção, para ele só um artista o deixaria transtornado: Chico Buarque.

Naquele dia de semana, o menino míope foi à praia de óculos ao invés de lentes. Mergulhou no mar gelado do Arpoador³ e ao sair da água decidiu comprar um refrigerante - sem os óculos. Ao entrar na ciclovia, sentiu um tropeção sobre seu corpo, de um praticante de cooper. Quase ia soltando um palavrão, quando ouviu um singelo " - Desculpe", tomou um tapinha nas costas, e notou um par de olhos cor de ardósia.

Ao ver o par de olhos, ficou na dúvida se era seu ídolo máximo, uma vez que aquela cor de olhos era raríssima. Tentou observá-lo, fazendo inclusive aquele ridículo buraquinho com as mãos, como uma pequena luneta. Quando o homem do cooper estava a mais de 100 metros de distância, um amigo seu veio lhe falar:

" - Cara, o Chico Buarque tropeçou em você!!!"

Depois deste dia - e desse incidente inglório - o menino sempre contou esta estória aos conhecidos e amigos, ressaltando que tomou um tapinha nas costas do Chico Buarque. E nunca mais foi à praia sem lentes de contato.


_________

1 - Famoso bloco percussivo do Rio de Janeiro; 2 - frase incidental de Fernanda Montenegro; 3 - A melhor praia urbana do mundo




Conto depositado por Art at 1:34 AM






quarta-feira, dezembro 08, 2004




Gauche



Vicente é jornalista. Acorda às 5:30 da manhã, beija sua mãe e seu pai. Benção. Brinca com o irmão, toma banho, se arruma e vai trabalhar. Vai de trem, coisa rápida. Escolheu este meio de transporte por mais um motivo: Às 6 da manhã de uma alvorada dessas, encostaram-lhe um revólver na cabeça. Não, não era ladrão, era polícia, e perguntava o que Vicente estava fazendo naquele carro, o seu carro, comprado com muito esforço. Ah esqueci de dizer, Vicente é negro.

Pois bem, continuando, ele pega o trem na estação. Trem lotado, cheio de trabalhadores humildes, alguns camelôs e dois ou três pastores chatos que gritam e pregam a viagem inteira. O trem chega ao seu destino. Aleluia.

O dia é cinza, que cobre o céu inteiro. O mormaço cobre o corpo de Vicente de calor. A camisa encharcada pelo suor, neste tempo abafado. E Vicente rasga as avenidas do centro da cidade, sem a mínima pressa, para poder observar a arquitetura. Observa a beleza dos prédios, mas também a tristeza dos menores, sujos e drogados debaixo das marquises, cheirando cola e tíner.

Observa os executivos, colados a outros executivos, que falam enrolando a língua, passando indiferentes aos desempregados que fazem fila em uma agência de trabalho qualquer. Para os executivos, aqueles não estudaram. Merecem estar assim. - "É o mesmo tipo de gente que rouba dinheiro público e empobrece o povo", pensa Vicente.

Continua a caminhar, observando todas as coisas que são necessárias ser vistas. Figuras permanentes do quadro que costuma-se chamar de "Cidade Maravilhosa". Com esse panorama, Vicente mareja os olhos. Luta para não deixar a lágrima cair, e consegue. Se imagina "gauche"¹, e talvez seja mesmo, por ser sensível - raridade nos tempos de hoje.

Chega ao trabalho, conseguido com muito esforço e capacidade, assim como a Universidade Pública, que ele, suburbano, fez no meio de tantos outros das elites dominantes. No meio daquele barulho de impressoras, chefes estressados e outros que não fazem nada, ele abre a janela. Dá de cara com a vista cinza de uma parede, mas sabe que atrás daquela parede tem um céu, uma visão, um Cristo Redentor.

Vicente é brasileiro, Vicente é humano, Vicente tem fé. E tendo fé, reza por aqueles que quase fizeram sua lágrima cair. Aqueles injustiçados. Reza por ele, por uma boa volta pra casa. Para abraçar o pai, para beijar a mãe, para sacanear o irmão, tricolor, enquanto ele é rubro-negro. Sabe que tem uma ótima situação em casa e agradece por isso, mas nem por isso deixa de lutar. Luta, vive e é feliz. E sabe que tem comidinha da mamãe esperando por ele em casa. Graças a Deus. Amém
_____


texto em homenagem a um grande amigo, Vicente, que - afora os exageros que o conto não prescinde - é uma pessoa fabulosa, sincera e leal. A ti, grande amigo dos sambas e do Maracanã, dos momentos bons e ruins, das vitórias e empates e comemorações de títulos do Flamengo em pleno posto de gasolina em Olinda no Carnaval, um grande e saudoso abraço, na certeza de que nos encontraremos de novo, para tomar uma cerveja e falar besteiras.

¹ Diferente, diverso; Palavra utilizada por Carlos Drummond de Andrade em um de seus mais famosos poemas - que obviamente não lembro o nome.




Conto depositado por Art at 1:31 AM






segunda-feira, dezembro 06, 2004




Um mundo melhor



Um mundo melhor não é propaganda do Rock n´Rio. Um mundo melhor não é uma coisa de fora para dentro. É coisa de dentro para fora, para ser feita com o coração e a alma. De preferência com ambos sincronizados. Porque todo ano queremos um mundo melhor, mas muitas vezes não fazemos nada para isso.

Um mundo melhor não é abaixar a cabeça. Jesus ofereceu a face e deu no que deu. É saber perdoar, mas perdoar reconhecendo a extensão do erro que foi cometido e o mal que este causou, porque uma pessoa machucada não faz um mundo melhor. Da mesma forma, é pedir perdão sabendo a besteira que fez, porque alguém sem noção de seus defeitos não faz um mundo melhor.

Um mundo melhor se faz com sorrisos. Muitos. Mas lágrimas são necessárias, porque sem lágrimas não há como se preparar para um sorriso, e tratar um sorriso como um Peso Argentino - sem valor - é um acinte.

Um mundo melhor se faz com amor, cafunés e cerveja. Sim, com cerveja, porque um mundo politicamente correto demais não é melhor. É chato. De chato já bastam algumas pessoas. O mundo tem que ser legal, o mundo tem que ter o suingue de Jorge Ben fase Samba Esquema Novo, o encontro da malícia com a inocência.

Um mundo melhor se faz com você. Um mundo melhor se faz comigo. Um mundo melhor se faz conosco. Mesmo que você não goste de mim. Ou vice-versa. Pegue o pedacinho do mundo onde eu não estou e faça um lugar melhor. Eu farei o mesmo em outro pedacinho. E - se não nos gostarmos - quando nos encontrarmos teremos pedacinhos melhores cheios de savoir-faire com o outro. Se nos gostarmos, uniremos os pedaços.

Um mundo melhor não se faz com promessas, e sim com atos. Estou tentando, tente também! Óbvio, sei que somos humanos e passíveis de - muitos - erros, mas se a gente não começar a tentar, quando melhoraremos? Então temos de tentar né? Pois é, vamos em busca de um mundo melhor. Olha, esse ano está acabando e esse texto também. Pense no que eu disse. Um bom ano que vem para você e para mim. Um bom mundo melhor para todos nós.




Conto depositado por Art at 1:49 PM






sexta-feira, dezembro 03, 2004




Miragem



Marcos era um rapaz tranquilo. Nascido na Bahia e morando há tempos no Rio, conseguiu mesclar sua malemolência baiana ao suingue sangue bom carioca sem nenhum problema. Adorava a cidade, suas vistas, seu futebol e suas mulheres. Falando em mulheres...

Já passava das 17 horas quando Marcos foi visitar seu amigo Rogério. Ao tocar a campainha, uma morena escultural veio atender a porta. Sorriso largo, curvas mais perigosas que as de Spa-Francorchamps¹ e um par de pernas fenomenal.

Marcos ficou abobalhado ao ver aquela escultura móvel. Perdeu até a fala. Convidado para entrar, pensava em muitas coisas. Entre as publicáveis, estas:

- " É muita mulher!"

- " É muito gostosa!"

- " É uma miragem!"

Inebriado pelo som de Chet Baker ecoando pela sala, Marcos batia papo animado com Marcela, nome pela qual ela se apresentou. Rogério, seu grande amigo, virou assunto secundário naquele momento. Com o decorrer do papo, Marcos tomou coragem e convidou Marcela para jantar. Ela respondeu com seu sorriso demolidor. Um sim inequívoco.

Marcos considerava aquela batalha ganha. Iria levá-la para jantar. Depois, na hora da sobremesa, era partir pro abraço. Rogério apenas observava de longe. Quando já estava discretamente encostando a mão nas pernas de Marcela, escutou a voz da mãe de sua presa fluir da cozinha:

- " Marcelo, quer jantar agora?"

Marcos achou que não tinha escutado direito. A voz se repetiu:

- " Marcelo, vai jantar ou não?"

- " Não mamãe, vou sair com Marcos para jantar."

Nunca se teve notícia de uma crise estomacal surgida de forma tão abrupta. Marcos ligou para Rogério semanas depois, esculhambando o amigo por ter lhe escondido que não tinha uma irmã e sim um irmão. O diálogo terminou como começou, com Rogério gargalhando do outro lado da linha:

- " Mas Marcão, você não perguntou nada..."

- " Pô Rogério, ela, ou ele, ou ele que era ela sei lá, era perfeita! Era uma miragem no deserto..."

Marcos levou para a vida toda a lição de que, quando há água demais no deserto, provavelmente é uma miragem. E em todos os encontros que teve após esse, procurou uma maneira de se certificar que estava com alguém que possuía cromossomos XX.


___________
¹ - Circuito de Fórmula 1 localizado na Bélgica, um dos mais rápidos - e perigosos - do mundo.



Conto depositado por Art at 1:04 AM






quarta-feira, dezembro 01, 2004




A Feiticeira e o Cavaleiro



Era uma vez um menino. Um menino muito esperto e forte, que não tinha medo de nada. Em suas caravelas de papel, era o almirante. O Barão Vermelho que pilotava pipas que rasgavam os céus, provocando a queda de outras, como ases alemães em aviões inimigos. Não tinha medo de sangue, não tinha medo da dor.

Encrencas com garotos maiores, cachorros ou vizinhos rabugentos não o faziam tremer, pois sabia que, quando chegasse em casa, sua avó estaria lá, como uma feiticeira imbatível, com a fórmula mágica para a cura de seus percalços, uma poção mágica chamada Elixir Sanativo, acompanhado de seus carinhos, conselhos ou broncas, livrando-o de todo mal.

Quando a noite chegava, não tinha medo do escuro, pois sua guardiã leria mais uma fábula na qual o bem venceria o mal, inexoravelmente. Cresceu acreditando nas coisas boas da vida, na felicidade. Estudou, se formou, batalhou, para orgulho de sua avó, a sua feiticeira imbatível.

O tempo passou e o menino virou homem. Um cavaleiro dos tempos modernos. Falando em tempo, ele surgiu como o grande inimigo de sua mentora. Começou a roubá-la, em uma rotina pontual e diária, pedaço a pedaço. Em um fatídico dia, se apresentou como “o” inimigo final: Invisível, incansável e - pior de tudo - invencível.

Por mais que ela lutasse e se mantivesse forte, a magia que a envolvia começou a se esvair e deixou-a desprotegida. O menino-homem que nunca teve medo, mas sempre teve esperança, se deparou com uma inversão de sentimentos. Conheceu a face gélida do medo e perdeu a sua esperança. Começou a não dormir, a chorar em seco, relembrando o passado como um grosso livro antigo, lido em segundos, com páginas se poendo e desaparecendo entre seus dedos.

O homem com alma de menino começou a se sentir só, e contestou um Deus que ele não sabia mais se existia, mas que, se existisse, seria muito injusto com ele e sua amada avó. A feiticeira, mesmo perdendo a luta contra o tempo, se mantinha serena e sábia. Lutar contra o tempo seria inútil, mas lutar pelo seu protegido cavaleiro jamais.

Sentia o olhar longínquo e diferente de seu querido neto. A alma infante, amedrontada e triste. Sabia que o destino a levaria, de forma quase intuitiva, mas antes disso teria de lutar para ensinar seu neto a domar e lidar com o medo, que deixado livre e selvagem, é um inimigo muito pior que o tempo.

E a isso ela se dedicaria até a hora em que o tempo a levar: A lutar pelo seu menino de ouro. Enquanto houver chances o menino lutará pela feiticeira. Enquanto houver sopro de vida, a avó lutará pelo cavaleiro. Mas ambos nunca esquecerão este dia. O dia em que o cavaleiro sentiu medo de perder a avó. E a feiticeira sentiu medo que o menino se perdesse.

______

Texto em homenagem a um grande amigo, o Ice Man, que passa por um momento delicado em sua vida. Mandei a ele o original, e ele colocou alguns pequenos - porém relevantes - pontos. O resultado está aqui, em um trabalho a quatro mãos: Duas mãos que sentem a dor e outras duas que são solidárias. Força amigo.




Conto depositado por Art at 1:32 PM








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Arthur Chrispin, 20 e poucos, Advogado feliz e contente, mas observador e amante da vida, músico, poeta e letrista por hobby, noivo, Capixaba de nascimento, Carioca de alma, Pernambucano por circunstância e amor. Feliz assim. Gosta de escrever contos, crônicas e o que der na telha. Sonha fazer 100 contos. Sabe que não valerão nada. Mas tem a cara de pau de publicá-los assim mesmo.


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